sábado, 13 de janeiro de 2018

A forma da água

"A forma da água" é encantador, não só pela maneira sensível da direção de Guillermo del Toro, mas por sua premissa curiosa ambientada em plena Guerra Fria, nos anos 60. O diretor nos surpreende ao contar a história de um belo e inusitado romance entre uma criatura fantástica mantida em cativeiro (um homem anfíbio) e uma faxineira muda de um laboratório do governo dos Estados Unidos.
 
O longa me encantou por ter uma essência textual e visual que remete ao ótimo "O fabuloso destino de Amelie Poulain". Há várias referências aqui, como o tom esverdeado da fotografia, a doçura da trilha sonora e as excentricidades das protagonistas. Ambas são introspectivas, carismáticas, especiais (uma é muda e a outra possui alguma 'anomalia' detectada pelo pai), padronizam o dia a dia com pequenas ações, têm maneiras diferentes de enxergar a vida e conhecem o primeiro amor que as tratam do jeito que elas merecem.
 
Del Toro, especialista em trabalhar com elementos fantásticos no cinema (fez "O labirinto do fauno", "Hellboy" e "Círculo de fogo"), está menos ambicioso na construção de universo e dramaticamente mais inspirado. Ele nos entrega cenas que, ainda que algumas possam soar bizarras, transpiram poesias e sentimentos genuínos.
 
"A forma da água" possui uma da atmosfera cativante. Sua construção se deve pela harmonia de diversos fatores, principalmente do designer de produção que faz uma reconstituição de época eficiente, da maquiagem realista e espetacular da criatura (inspirada em "O Monstro da Lagoa Negra"), da excelente atuação de Sally Hawkins, que proporciona pureza e leveza na comunicabilidade de Elisa para com o monstro, e da bela trilha sonora de Alexandre Desplat (vencedor do Oscar por "O Grande Hotel Budapeste"), que é utilizada de forma pontual e também contribui para a composição da sensibilidade implantada pelo diretor.
 
O roteiro, assinado por Del Toro e Vanessa Taylor, além de investir em um romance incomum com toques de fantasia (e por que não de Shakespeare?), traz personagens interessantes nas subtramas. Há o diretor 'linha dura' e egocêntrico do tal laboratório (interpretado pelo ótimo Michael Shannon) que tem prazer em machucar o ser misterioso; o cientista e agente duplo russo que quer preservar a vida da criatura; a colega de trabalho negra que é super protetora da protagonista (em boa presença de Octavia Spencer) e o amigo homossexual (vivido pelo competente Richard Jenkins) com quem Elisa mora e que coleciona algumas frustrações.
 
Todos os personagens, incluindo a figura monstruosa e a deficiência de Elisa, contribuem para o cenário da diversidade apresentado pelo enredo. Além disso, ainda há crítica sobre a intolerância, metaforizada pela falta de humanidade no ser humano, e um excelente senso de respeito no contraste das relações humanas que fará o espectador refletir. Enfim, "A forma da água" é uma bela história de amor e igualdade que merece ser apreciada por todos.
 
A forma da água (The Shape of Water)
2017, EUA - 124 minutos
Romance
Direção: Guillermo del Toro
Roteiro: Guillermo del Toro e Vanessa Taylor
Elenco: Doug Jones, Michael Shannon, Michael Stuhlbarg, Octavia Spencer, Richard Jenkins,
Sally Hawkins, David Hewlett, John Kapelos, Lauren Lee Smith, Nick Searcy, Stewart Arnott
Cotação: * * * * *